Quando não chegava atrasada, jogava conversa fora com a recepcionista ou com um grupo de colegas que também aguardava o início da aula no pequeno pátio que antecedia a sala de dança.
Sempre corriam em círculo, para se aquecerem. Dez minutos. Às vezes menos. Noutras, pouco mais. Ela já se atrasara várias vezes para burlar a parte tediosamente aeróbica do treino. Já houve, no entanto, ocasiões em que fazia da corrida um momento para pensar em coisas realmente sérias da sua vida. Seríssimas e diretamente proporcionais a sua idade, claro! Na caminhada que acalmava a pulsação, depois na inspiração lenta e profunda das narinas, sempre expirava um alívio ou um sopro branco; por vezes, um suspiro genuíno.
Depois, era a loteria dos exercícios: centro ou da barra? Ela, que sempre achou o nome providencial para o treino feito nas paralelas, torcia sempre para uma série de alongamentos de pé ou no chão, no centro da sala. Quase nada era tão desafiador para ela do que brigar contra a vontade própria que seus joelhos pareciam possuir, quando insistiam em pender para dentro, em uma série de pliés ou passés.
Em seguida, o prazer das séries, dos passos, dos saltos e das piruetas na diagonal da sala. Naquele momento, em dupla ou individualmente, eram supervisionados pela professora de olhos atentos de orgulho ou de reprovação. Quando não eram corrigidos, acreditavam-se bailarinos, quando recebíamos elogios, estrelas!
" - Coreografia!"
Na voz da professora, a senha para o divertimento da alma. O momento onde racionalizavam o amor pela dança. Luz de palco. Passos sincronizados. Desenhos corporais. Simbiose entre música e gestos. Sentimentos e sensações. Cabeça erguida. Pernas esguias. Pontas de pés rígidas. Timidez diluída no suor, e uma mistura insolúvel de deslumbre e orgulho. Ensaio para o êxtase dos espetáculos, dos festivais, dos palcos!!!
Matéria prima para lembranças futuras. O ex futuro que virou presente e que agora faz parte do passado.
Essencial para a sanidade da felicidade do hoje e da esperança do porvir.
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