quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Sentiments cet après-midi






*** Instrução de uso: Escute a música, enquanto lê.

Adoro o time que escolhi para torcer, tenho orgulho em ser atleticana, em gritar "Galo", mas hoje, em dia de jogo importante, penso que minha animação pela ótima fase do glorioso - quase inédita, reconheço sem constrangimento, posto que paixão nada tem a ver com razão - é um contentamento agridoce. Simultaneamente ácido e doce, porque me faz perceber que é um dos raros motivos - o que é diferente de raros momentos, o objeto é que é raro -  de alegria autêntica que tenho experimentado. Há que se ressaltar que me refiro a autenticidade como algo franco e que não declino a teoria de que torcedores são frutos de uma  construção sócio-cultural, admitindo-me rendida a esta; ainda acrescentando não me sentir coagida, no entanto.


Gostaria de ter outros motivos, de outros âmbitos, para me sentir altiva. Mas o que tenho produzido são breves, apesar de intensos ímpetos. Por vezes, de uma nostalgia pelo que não foi vivenciado por minhas próprias escolhas, já que não me permito sofrer pela oportunidade que não me foi oferecida; noutras pela minha pouca coragem, mascarada de ingenuidade, que também pode ser denominada como o que sou de verdade.


Certo é que, pensando nos pequenos prazeres, no desejo de ser protagonista de uma história de amor arrebatadora e ao mesmo tempo reta, lembrando das pessoas em que tomei como modelo, nas carreiras e profissões que almejei foi que me identifiquei com Amèlie Poulain, ao mesmo tempo em que a julguei tão diferente de mim, desejando para mim mesma os sentimentos que ela consegue produzir de forma tão competente e delicada.


Partilho com a personagem traços em comum: ela é intensa, apesar de negar o caráter devaneador para o resto do mundo, come uma lata de leite condensado escondido, a trilha sonora de sua vida é melancólica, mas também prende pela beleza refinada, imagina desenhos com as formas das nuvens (desde criança), deseja extaziar os que estão a sua volta, como se tranfere a um filho os sonhos não realizados, seu coração bate mais e mais forte em determinados momentos, o que faz disso quase uma anomalia.


O que a faz tão distinta de mim é originada justamente em outro traço em comum nas nossas personalidades: Ver beleza na solidão. Foi no distanciamento das pessoas que Amèlie descobriu os prazeres nas pequenas coisas, nos detalhes. Foi no que passa desapercebido pelos olhares mais ordinários que ela se fartava, como quando afundava os dedos em uma saca de grãos, causando uma excitação inominável, ou quando estourava plástico bolha.


Valorizo meus momentos de solidão, mas apenas para adornar minhas angústias e nesses momentos valorizo apenas esse estado de quase êxtase invertido. Tenho deleite em meus pesares, uma espécie de masoquismo moral para expurgar minhas dores e castigar meus remorsos. E funciona, muitas vezes, mas nem todas. E é justamente nas negativas que invejo o dom da moça que não teve amigos de escola - e nisso me julgo privilegiada, apesar de não haver mérito (plagiando Paulo Freire). 


Queria ter me percebido uma pessoa realizada nos pequenos acontecimentos. Queria ter podido, além de reconhecer, ter sentido, ter dado fé, da sorte e das bênçãos recebidas pela vida, em várias ocasiões. Mas não. Meus momentos de pequenas satisfações são bem mais irrisórios e menos glamurosos. São atividades bem mais pragmáticas. Gosto de fazer palavras cruzadas e desencravar pelos na virilha.

Contudo, a maior inveja que nutro pela trajetória da moça de destino fabuloso é uma voz marcante, reproduzida em um idioma charmoso, que narra sua vida, com exclusividade.


*As imagens são cenas do filme " O Fabuloso  Destino de Amèlie Poulain"

3 comentários:

Elga Arantes disse...

Corrijam meu francês de Google tranlator, por favor.

Marcos Rittner - Author disse...

O filme é tão espetacular, a personagem idem. Carrega dentro dela impulsos que muitos de nós carregamos aqui dentro, de ser um justiceiro mascarado, ou de fazer o bem aleatório a pessoas desconhecidas. Esse tema me toca tanto que fui buscar as musicas da trilha sonora para aprender no piano (não são tão dificeis como parecem). Muito bonita sua postagem, delicada e abrangente ao mesmo tempo.

Elga Arantes disse...

Acho simplesmente maravilhosas músicas ao piano. As músicas do filme mexeram muito comigo, mesmo! Tenho as gravadas em um playlist.

Obrigada pela visita.

Um abraço.