segunda-feira, 5 de abril de 2010

Ter ou não ser: a resposta da questão



Ela olhou, sem fitar, o metrô ir e voltar. E ir, mais uma vez. Até pensou, por poucos instantes, em quatro ou cinco das tantas estações em que ele passaria. Nomes de flores, de santos. Depois, fechou os olhos e retornou ao estado de desespírito. Queria a certeza da posse, mesmo que a propriedade fosse a dúvida que qualificava como efêmera, essa intenção. Alguém celebrou com palavras o medo que ela tinha de descobrir que não tinha nada, além do que não foi conquistado por ela. Uma bênção é mais sorte que merecimento, concluíra a poucos dias. Não queria o clichê de vislumbrar o ponto de luz se aproximando progressiva e sincronicamente à evolução do barulho que fazia o monstro de lata retornando, de novo, e, por isso, fechou os olhos de maneira cinematográfica. Deu dois passos à frente. Abriu os olhos para conferir a linha amarela que separava seu estado de confusão mental e depressão espiritual, do estado de nada; do não-estado; do não estar. Iria mergulhar no vão. E foi assim que agregou mais uma dúvida a sua coleção de exemplares genuínos. Não sabia mais se havia sido feliz, tido amigos verdadeiros, forjado a verdade naquela vez, ou vivido a mentira na íntegra: Coleção da versão passado. No presente, queria o presente da certeza que aquele vão não era dúvida - Pensou em reformular o argumento porque pensava que as duas ideias não podiam coexistir, nem na mesma frase - O presente de um futuro que nunca existiria. Futuro metafísico. Mas calculou mal o tempo e a coragem. O metrô passou. Perdera o bonde, mais uma vez; como era comum acontecer na vida que não era dela. Voltou pra casa que morava de favor, dentro de um corpo que (não) possuía, por acaso. Ofereceu a quem, de direito, que, sentindo o cheiro agridoce do sangue que vinha dele, recusou. A alma, que só não fora vendida porque também não lhe pertencia, ficara naqueles trilhos, estraçalhada por um evento intencional privado de sentido.

... E seu corpo teria que trilhar novas estações. Com nomes de flores e nenhum nome de santo. De etéreo, desejava apenas um final digno e que lhe pertencesse.

Por Elga Arantes, 2010.

9 comentários:

Paty disse...

Às vezes, acho que os textos não são seus. Vc na vida real não é tão assim né? Complexa... se bem que é. kkkkkk

Bel disse...

É por essas e por (tantas)outras que venho aqui. Venho pra ver a tua volúpia em se desfazer pra se perceber.
Frases como essa: "E foi assim que agregou mais uma dúvida a sua coleção de exemplares genuínos" ... acabam confirmando minhas impressões sobre ti: ADORÁVEL!
Tu és uma escritora ... das mais talentosas!

Muitas saudades, minha querida.

Um grande beijo,

Sininho.

Karen disse...

Amiga do meu coração. Queria te ligar para desejar um feliz aniversário e ouvir a sua voz mas não tenho seus telefones neste aparelho. Se ver este msg hoje e puder me ligar só dando um toque para que eu te ligue de volta ficaria mto feliz!
Um grande beijo.

Bel disse...

Adorável ... te disse lá no mundo dos iogurtes sobre o quanto é especial te ter por perto. Mesmo que esse perto não seja o ideal.
Te desejei lá todos os meus melhores desejos:
Que seja um lindo Ano Novo: que tenhas saúde, amor e arte.
Adoro-te,

Um beijo cheio de carinho,

Bel.

Elga Arantes disse...

Kawanami, não tô sofrendo, não. Quem te enganou? É nisso que dá servir o exército... Quer dizer que homem não sofre? Ahhh! Então é por isso que minha vida é uma festa. De Baco!!!

Bel, escritora... quem me dera! Vc, é vezes mais adorável!Vou lá, agora, então!!!!

Karen, pois é, vi tarde. Mas respondi seu email. Em agosto, acho que nos veremos. Ebaaaa!!!

fab disse...

"sério" o quê?

Daniel Dragomirescu disse...

Un saludo desde Rumania!
Daniel D. Peaceman, escritor y editor

Sheyla disse...

Por vezes, sinto-me num corpo que parece não ser meu. Por vezes, sinto-me presa nesse corpo. Por vezes, sinto-me no estado do nao estar. Assim, viajo...
Bjs.

Grasi disse...

Noooossa!! Adorei passar por aqui... vou voltar mais vezes, com certeza!
Bjão e ótimo domingo