sábado, 4 de julho de 2009

Prata líquida quer valer ouro.


Como estou confusa! Na verdade, não sei nem explicar do que exatamente estou falando. De qual categoria. Não tenho sabido, nem mesmo, nomear as ocorrências da minha vida, por assim dizer. Penso que, na verdade, posso ser e não, simplesmente, estar confusa.


Não acho que algum dia pude me definir. Mesmo porque, a definição me limitaria e acredito, hoje, que eu seja como um metal daqueles de transição. Nas situações de graus mais negativos, solidifica-se. Eu endureço e fico fria.


Uma boa condutora de eletricidade, muita energia (!), mas que nem sempre transmite o calor que deseja. Uma gota de mercúrio! Um líquido, em condições normais, e quase com cara de sólido. Um fluido encorpado, denso, que vai assumindo várias formas, dependendo do molde a que foi submetido.


Uma espécie de caldo pastoso que escapole ao tentar pegá-lo com as mãos. Que se divide em tantas partes, quando da tentativa de captura. Que desprende, desliza e escorre, sem molhar o caminho onde passa. Sem deixar rastros. Quando recolhido, o que deixa são pequenos fragmentos dele mesmo. E, na primeira oportunidade de aproximação, engloba novamente o que ficou pra trás, o que lhe foi tirado. E tudo fica como era antes.


Quando a coisa esquenta um pouco mais, pode se tornar tóxico, corrosivo, causando danos a quem estiver por perto. É útil, mas pode ser danoso. É perigoso, mas necessário. É bom e é ruim. Um desconchavo.


Fui passional demais. Coloquei meus amores em primeiro plano. Tentei lhes adivinhar os desejos, entender suas angústias, desvendar os segredos, confortar lhes na dor, conhecer o íntimo de cada um deles. E assim, segui sem entender nada de mim. Sempre acreditei que eu era uma bolinha de mercúrio deixada para trás e que, em algum momento, aquela grande mancha prateada viria me resgatar e me fazer entender um só corpo.


Em algum momento, o termômetro se quebrou, deixando fugir todo o líquido que podia medir o calor das paixões. Sou várias gotinhas esparramadas no assoalho de uma casa desocupada. Quem me olhar, pode achar que sou uma esfera metálica rígida, mas se chegar mais perto, se conseguir me tocar, perceberá minha fluidez. Espero alguém que me toque com o cuidado de não me espalhar mais. Não quero mais ser vários pedaços de mim mesma. Quero juntar as partes dissipadas de mim e me fazer inteira. Quero estar inteira.


Não quero mais precisar que outras pessoas digam quem sou. Quero me descobrir com meus próprios meios. Quero olhar no espelho e me reconhecer. E sei que posso. Afinal, os espelhos são feitos de mercúrio.


Por Elga Arantes, 2009.

3 comentários:

sblogonoff café disse...

Moça,
a tarefa de descobrir-se é engraçada, principalmente para os fluidos! Porque cada dia tem uma forma diferente. Eu não entendo muito de química, embora saiba que transição parece ser o nosso estado permanente (!), ainda mais se recorrermos à Heráclito que dizia que "só é duradouro aquilo que se renova". E como você mesmo citou aqui uma vez: A Modernidade é líquida.
Os amores ainda mais.
Você é um coração inteiro, normal essa doação, essa entrega aos amores! Eu até queria ser assim!
Só não vale se transformar naquele vilõ do Exterminador do Futuro, lembra?! Um andróide de metal líquido, que não morria nunca!?
Ninguém vai resistir se você usar os seus poderes par o mal! (Rs!)
Bão, Creuza, já falei que não sou muito boa de química e estou no primário na escola da paixão, mas deixo um aviso:
Quando você se sentir fragmentada, e resolver andar uns quilômetros, eu juro que vai ter banana com leite condensado e canela te esperando aqui!

Sopro de Eves!

Bel disse...

Adorável ...
Ainda que sobrasse só um pontinho invisível de mercúrio caído numa frestinha desse assoalho, ainda assim, alguém (vários alguéns) te avistaria(am). Impossível se desviar de preciosidades, acredite?
Quanto a saber quem se é ... disso eu sei brincar, querida. Fui exigindo esse exercício de caligrafia ampliada pra além do espaço possibilitado entre os limites das linhas limitadoras. Fui avançando ao escrever meu nome completo. Inclui outro sobrenome ao meu e tudo se ampliou. Ainda se amplia ... a descoberta é contínua mesmo... ainda que a essência seja reconhecida e sustentada.
Sei que já consegues te ver ... sei que tua exigência quer mais ... terás!
Que assim seja!

Teus textos estão cada vez mais fundamentados .... teus recortes são finos e muito bem explorados. Sempre aprendo contigo, Adorável!

Um beijo carinhoso ... daqueles bem grandes.
Bel.

Jabocity disse...

Vc voltou a usar toxico?
Maluca...